sexta-feira, 8 de agosto de 2008

"Quem conta um conto aumenta um ponto"

O QUE É MESMO CONTO POPULAR?

Os contos populares são anônimos, de origem longínqua e imemorial. Porém, nos nossos dias, os contos populares são, antes de qualquer coisa, textos fixados pela escrita nas revistas folclóricas, nas recolhas dos estudiosos, nos livros para crianças. São clássicos do Brasil e Portugal.
Na sua maioria de ensinamentos, sobrevivem e são divulgados de forma oral desde o tempo do descobrimento, ou antes, já que muitos foram ajustados de versões da Europa Medieval. Ao contrário das lendas, não se espera que os fatos relatados nos contos populares tenham, na verdade, acontecido e normalmente não envolvem heróis nacionais.
Embora o termo "conto popular" seja muitas vezes usado com a definição de "conto de fadas" e vice-versa, são duas formas literárias diferentes. No entanto, de um modo geral, os contos populares falam dos costumes, superstições e crenças de pessoas comuns, já os contos de fadas costumam estar habitados de duendes, fadas e outras criaturas fantásticas com poderes mágicos. A Madrasta, por exemplo, é uma somatória de contos populares infantis, entre eles, e principalmente, A Menina enterrada viva.
A noite é a ocasião mais favorável para contar histórias às crianças, antes do seu sono, e aos mais adultos durante as suas reuniões tardias. O narrador concentra toda a sua sutileza e a sua expressão para contar as suas histórias, com intenção de transmitir, o melhor possível, as suas mensagens e a sua moralidade.
O Conto infantil só estabeleceu legitimamente uma forma literária resolvida na ocasião em que os Irmãos Grimm, no início do século XIX, deram a uma coletânea de narrativas o título de Kinder und Hausmärchen (Histórias das Crianças e do Lar). Foi este trabalho dos Grimm que agrupou a variedade de textos infantis que até então existia num conceito padronizado que, como tal, passou a ser a base de todas as inúmeras coletânea seguintes ao século XIX.
Diversos psicanalistas já apontaram a importância dos contos populares ou infantis para a estruturação da individualidade da criança ou do adulto. Na verdade, os contos traduzem as barreiras que a criança vai percorrer os problemas que a ameaçam, os medos de destruição ou de morte, a sexualidade, as perversões, etc. Daí que só possamos concluir pela importância que este tipo de narrativas teve, tem e continuará a ter nas sociedades.

Quem somos/Nosso propósito


Com o acompanhamento da professora de Produção de texto Mary Jane Dias da Silva este blog, realizado por alunas universitárias do curso de Letras Português da Universidade Federal de Sergipe - Ana Bárbara Santos Costa, Elys Daniele Siqueira e Graziele dos Santos Monteiro - tem como objetivo didático. Pretende o alcance de alunos de ensino fundamental a ensino médio e, com isso, despertar nos mesmos uma curiosidade e uma interesse maior acerca do gênero abordado neste veículo de comunicação que se traduz em Contos Populares.

Os Compadres Corcundas

Era uma vez, dois compadres corcundas, um Rico outro Pobre. O povo do lugar vivia zombando da corcunda do Pobre e não reparava no Rico. A situação do Pobre andava preta, e ele era caçador.
Certo dia, sem conseguir caçar nada, já tardinha, sem querer voltar para casa, resolveu dormir ali mesmo no mato.
Quando já ia pegando no sono ouviu uma cantiga ao longe, como se muita gente cantasse ao mesmo tempo.
Saiu andando, andando, no rumo da cantiga que não parava. Depois de muito andar, chegou numa clareira iluminada pelo luar, e viu uma roda de gente esquisita, vestida de diamantes que brilhavam com a lua. Velhos, rapazes, meninos, todos cantavam e dançavam de mãos dadas, o mesmo verso, sem mudar:
Segunda, Terça-feira,
Vai, vem!
Segunda, Terça-feira,
Vai, vem!
Tremendo de medo, escondeu-se numa moita e ficou assistindo aquela cantoria que era sempre a mesma, durante horas.
Depois ficou mais calmo e foi se animando, e como era metido a improvisador, entrou no meio da cantoria entoando:
Segunda, Terça-feira,
Vai, vem!
E quarta e quinta-feira,
Meu, bem!
Calou-se tudo imediatamente e aquele povo espalhou-se procurando quem havia falado. Pegaram o corcunda e o levaram para o meio da roda. Um velhão então perguntou com voz delicada:
- Foi você quem cantou o verso novo da cantiga?
- Fui eu, sim Senhor!
- Quer vender o verso? - perguntou então o Velhão.
- Quero sim, senhor. Não vendo não, mas dou de presente porque gostei demais do baile animado.
O Velho achou graça e todo aquele povo esquisito riu também.
- Pois bem - disse o Velhão - uma mão lava a outra. Em troca do verso eu te tiro essa corcunda e esse povo te dá um Bisaco novo!
Passou a mão nas costas do caçador e a corcunda sumiu. Lhe deram um Bisaco novo e disseram que só o abrisse quando o sol nascesse.
O Caçador meteu-se na estrada e foi embora. Assim que o sol nasceu abriu o bisaco e o encontrou cheio de pedras preciosas e moedas de ouro.
No outro dia comprou uma casa com todos os móveis, comprou uma roupa nova e foi à missa porque era domingo. Lá na igreja encontrou o compadre rico, também corcunda. Este quase caiu de costas, assombrado com a mudança. Mais espantado ficou quando o compadre, antes pobre e agora rico, contou tudo que aconteceu ao compadre rico.
Então cheio de ganância, o rico resolveu arranjar ainda mais dinheiro e livrar-se da corcunda nas costas.
Esperou uns dias e depois largou-se no mato. Tanto fez que ouviu a cantoria e foi na direção da toada. Achou o povo esquisito dançando numa roda e cantando:
Segunda, Terça-feira,
Vai, vem!
Quarta e quinta-feira,
Meu, bem!
O Rico não se conteve. Abriu o par de queixos e foi logo berrando:
Sexta, Sábado e Domingo,
Também!
Calou-se tudo novamente. O povo esquisito voou para cima do atrevido e o levaram para o meio da roda onde estava o velhão. Esse gritou, furioso:
- Quem mandou se meter onde não é chamado seu corcunda besta? Você não sabe que gente encantada não quer saber de Sexta-feira, dia em que morreu o filho do alto; sábado, dia em que morreu o filho do pecado, e domingo, dia em que ressuscitou quem nunca morre? Não sabia? Pois fique sabendo! E para que não se esqueça da lição, leve a corcunda que deixaram aqui e suma-se da minha vista senão acabo com seu couro!
O Velhão passou a mão no peito do corcunda e deixou ali a corcunda do compadre pobre. Depois deram uma carreira no homem, que ele não sabe como chegou em casa.
E assim viveu o resto da sua vida, rico, mas com duas corcundas, uma na frente e outra atrás, para não ser ambicioso.

O Menino o Burro e o Cachorro

Um menino foi buscar lenha na floresta com seu burrico e levou junto seu cachorro de estimação.
Chegando no meio da mata, o menino juntou um grande feixe de lenha, olhou para o burro, e exclamou:
- Vou colocar uma carga de lenha de lascar nesse burro!
Então o Jumento virou-se para ele e respondeu:
- É Claro, não é você quem vai levar!
O Menino muito admirado com o fato de ter o burro falado, correu e foi direto contar tudo ao seu pai. Ao chegar em casa, quase sem fôlego, ele disse:
- Pai, eu estava na mata juntando lenha e depois de preparar uma carga para trazer, e quando eu disse que ia colocá-la na garupa do burro, acredite se quiser, ele se virou para mim e disse: "É Claro, não é você quem vai levar!"
O Pai do menino, olhou-o de cima para baixo, e meio desconfiado repreendeu ele:
Você está dando para mentir agora. Onde já se viu tal absurdo, animais não falam!
Nesse momento, o cachorro que estava ali presente, saiu em defesa do garoto e falou:
Foi verdade, eu também estava lá e vi tudinho!
Assustado o pobre camponês, julgando que o animal estivesse endiabrado, pegou um machado que estava encostado na parede e o ergueu para ameaçá-lo.
Nesse momento, aconteceu algo ainda mais curioso. O machado começou a tremer em suas mãos, e de dentro dele saiu uma voz que soava temerosa:
O senhor tenha cuidado, esse cachorro pode me morder!

O Bicho Folharal

Cansada de ser enganada pela raposa e de não poder segurá-la, a onça resolveu atraí-la à sua furna. Fez para esse efeito correr a notícia de que tinha morrido e deitou-se no meio da sua caverna, fingindo-se de morta.
Todos os bichos vieram olhar o seu corpo, contentíssimos.
A raposa também veio, mas meio desconfiada ficou olhando de longe. E por três dos outros animais gritou:
"Minha avó, quando morreu, espirrou três vezes. Espirrar é o sinal verdadeiro de morte."
A Onça, para mostrar que estava morta de verdade, espirrou três vezes. A raposa fugiu, às gargalhadas.
Furiosa, a onça resolveu apanhá-la ao beber água. Havia seca no sertão e somente uma cacimba ao pé de uma serra tinha ainda um pouco de água. Todos os animais selvagens eram obrigados e beber ali.
A onça ficou à espera da adversária, junto da cacimba, dia e noite. Nunca a raposa sentira tanta sede. Ao fim de três dias já não agüentava mais. Resolveu ir beber, usando duma astúcia qualquer.
Achou um cortiço de abelhas, furou-o e com o mel que dele escorreu untou todo o seu corpo. Depois, espojou-se num monte de folhas secas, que se pregaram aos seus pêlos e cobriram-na toda. Imediatamente, foi à cacimba.
A onça olhou-a bem e perguntou:
- Que bicho és tu que eu não conheço, que eu nunca vi?
- Sou o bicho Folharal. - respondeu a raposa
- Podes beber.
Desceu a rampa do bebedouro, meteu-se na água, sorvendo-a com delícia e a onça lá em cima, desconfiada, vendo-a beber demais, como quem trazia uma sede de vários dias, dizia:
- Quanto bebes, Folharal!
Mas a água amoleceu o mel e as folhas foram caindo às porções. Quando já havia bebido o suficiente, a última folha caíra, a onça reconhecera a inimiga esperta e pulara ferozmente sobre ela, mas a raposa conseguira fugir.

Era uma vez, no Caniço...

Era uma vez uma viúva e um viúvo: a viúva tinha uma filha e o viúvo também tinha uma. Ambas se chamavam Maria. A filha do viúvo ia à casa da viúva e brincava com a Maria da viúva. E a viúva dava muito pão e mel à Maria do viúvo. E depois dizia:
-Maria tu hás-de dizer ao teu pai que case comigo, que eu sou muito tua amiga, vou-te dar sempre pão e mel
Depois a filha perguntou ao pai:
-Pai, o pai porque não casa com a viúva? Ela é muito minha amiga; dá-me sempre pão e mel.
Dizia o pai:
-Ó minha filha, ela agora dá-te pão e mel, mas depois vai te dar pão e fel.
A Maria do viúvo ia sempre a casa da viúva. Esta perguntou-lhe:
- Então, tu disseste ao teu pai para casar comigo?
Eu disse, mas o pai disse que não; que a senhora agora era muito minha amiga, mas depois ia ser minha inimiga - dava-me pão e mel agora, mas depois ia me dar pão e fel.
A Maria do viúvo continuava a ir à casa da viúva brincar com a filha da viúva. E tanto a viúva foi dizendo que queria casar com o viúvo e a filha foi pedindo ao pai até que ele sempre casou.
A viúva mandava a Maria do viúvo - a enteada - para a cozinha e a filha dela era mais estimada. Depois ainda lhe dava muito trabalho: dava-lhe um par de meias para ela fiar num dia. Se ela não fizesse aquele trabalho dava-lhe uma sova - uma malha. Mas a Maria fez o par de meias por dia. Depois no outro dia, a madrasta deu-lhe par e meio de meias para ela fazer e se não conseguisse, levava uma malha. A Maria tinha uma vaquinha que a mãe lhe tinha deixado e então ia para o pé da vaquinha chorar, quando a madrasta lhe destinava muito trabalho. E a vaquinha perguntava:
- Maria, tu o que tens?
a Maria respondia:
- A minha madrasta dá-me muito trabalho e se eu não o fizer, ela dá-me uma malha, à noite.
A vaquinha respondeu:
- Põe aqui essa lã nos meus corninhos, que eu vou te ajudar.
E ela assim fez: Pôs a lã nos corninhos da vaquinha e chegou-se à noite estavam as meias prontas.
À noite, foi apresentar à madrasta o trabalho. A madrasta ficou invejosa e pensou que alguém a tinha ajudado, porque era impossível fazer aquele trabalho num dia sozinha. Mas no outro dia ainda lhe deu mais trabalho e a Maria voltou a ir para o pé da sua vaquinha chorar. A vaquinha dizia sempre para ela não se afligir e colocar a lã nos seus corninhos que o trabalho ficaria feito.
Cada vez a madrasta ficava mais desconfiada com o trabalho apresentado pela Maria do viúvo. Mas a vaquinha tinha nascido na noite de Natal e por isso tinha uma varinha de condão.
A madrasta começou a fazer planos para descobrir quem ajudava a Maria do viúvo. Um dia comprou tremoços e disse-lhe:
- Isto é para tu comeres quando fores andando, pelo caminho.
E ela assim fez; foi andando e comendo pelo caminho. Mas a madrasta mandou a filha ver até onde iam as cascas de tremoços. A Maria da viúva verificou que iam até o palheiro onde a filha do viúvo tinha a sua vaquinha e encontrou-a a conversar com a vaquinha e esta a ajudá-la no trabalho.
A filha da madrasta contou à mãe e esta fingiu-se doente e disse ao marido que a sua doença só se curava com um pedacinho de carne da vaquinha da Maria. O marido ficou triste porque não tinha coragem de fazer tal pedido à filha. Esta que o viu triste insistiu até que o pai lhe dissesse a razão da sua tristeza.
Quando o pai lhe explicou, a Maria ficou muito triste e foi chorar para o pé da sua vaquinha. Também ela teve de arrancar de Maria a razão da sua tristeza. Logo que a Maria lhe contou o desejo da Madrasta, a vaquinha disse:
- Não te aflijas. Diz que sim, mas com a condição de seres tu a lavar e arranjar as minhas tripinhas. A madrasta concordou e disse:
- Quero lá saber das tripas, eu quero é a carne.
Mas a vaquinha avisou a Maria que apenas encontrasse uma varinha de condão que estava nas suas tripas, não se importasse de arranjar o resto das tripas e lavasse muito bem a varinha e a colocasse debaixo da toalha do altar, mas de modo que o padre não soubesse e que, quando acabasse a missa, fosse lá buscá-la, mas de tal maneira que ninguém visse. E disse-lhe:
- Tudo o que tu precisares tu pedes em meu nome que eu vou te conceder a graça.
A Maria do viúvo continuou a trabalhar na cozinha e a Maria da viúva era muito estimada.
Chegou-se ao Domingo mãe e filha foram para a missa. E a Maria do viúvo dizia:
- Eu também queria ir à missa
As duas respondiam:
- Nem penses nisso, não tens roupa capaz de ir para a missa.
A Maria chorou e pediu à varinha de condão que lhe concedesse a graça de ter um fato para ir à missa. Então a varinha de condão concedeu-lhe essa graça. Deu-lhe um fato lindo como o Sol e ela também ficou toda formosa e foi à missa. Mas deixou primeiro elas caminharem para então ir para a missa.
Quando a madrasta e a filha chegaram da missa contaram que tinham visto uma menina muito linda, linda como o Sol, dentro da igreja. A Maria fingiu não saber de nada e disse que tinha muita pena de não a ter visto. No Domingo seguinte, sucedeu o mesmo. E ao terceiro Domingo também, mas com uma diferença, a Maria perdera um sapatinho de ouro. Um príncipe achou o sapato e disse que casaria com a menina a quem servisse aquele sapato. O príncipe foi por todas as casas para as meninas o experimentarem. Quando ele passou na casa da viúva, o sapato serviu na filha da viúva e o príncipe levou-a para casar consigo. Mas, quando já iam embora, o cãozinho começou a ladrar e a dizer:
- Lu! Lu! Menina bonita fica em casa, menina feia levas tu.
O príncipe voltou atrás e insistiu com a madrasta até que esta confessou que tinha uma enteada, mas que era feia e não tinha roupa. O príncipe quis vê-la. A Maria do viúvo pediu à varinha de condão a roupa e o outro sapatinho de ouro que havia usado no Domingo anterior e apareceu toda linda e o príncipe casou com ela.

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

O Menino e o Padre


Um padre andava pelo sertão, e como estava com muita sede, aproximou-se duma cabana e chamou por alguém de dentro.
Veio então lhe atender um menino muito mirrado.
- Bom dia meu filho, você não tem por aí uma aguinha aqui pro padre?
- Água tem não senhor, aqui só tem um pote cheio de garapa de açúcar! Se o senhor quiser... - disse o menino.
- Serve, vá buscar. - pediu-lhe o padre.
E o menino trouxe a garapa dentro de uma cabaça. O padre bebeu bastante e o menino ofereceu mais. Meio desconfiado, mas como estava com muita sede o padre aceitou.
Depois de beber, o padre curioso perguntou ao menino:
- Me diga uma coisa, sua mãe não vai brigar com você por causa dessa garapa?
- Briga não senhor. Ela não quer mais essa garapa, porque tinha uma barata morta dentro do pote.
Surpreso e revoltado, o padre atira a cabaça no chão e esta quebra-se em mil pedaços. E furioso ele exclama.
- Moleque danado, por que não me avisou antes?
O menino olhou desesperado para o padre, e então disse em tom de lamento:
- Agora sim eu vou levar uma surra das grandes; o senhor acaba de quebrar a cabacinha de vovó fazer xixi dentro!

A Garotinha


Com os pés descalços e sujos, a garota apenas sentou e assistiu as pessoas passarem. Ela nunca tentou falar, nunca disse uma palavra. Muitas pessoas passavam, mas ninguém parava.
No dia seguinte, eu decidi voltar para o parque, curioso se a garotinha ainda estaria lá.
Ela se encontrava no mesmo local que ontem, mas com um olhar mais triste.
Hoje eu resolvi tomar uma atitude e andei em direção à garotinha.
Como todos sabem, um parque cheio de pessoas estranhas não é um local apropriado para uma criança brincar sozinha.
Enquanto eu andava em direção a ela, pude ver que nas costas do vestido da garotinha havia uma deformidade. Eu descobri a razão porque as pessoas passavam e não moviam um único dedo para ajudar.
Enquanto chegava mais perto, a garotinha levemente desviou o olhar para evitar que eu a encarasse.
Eu pude ver o formato de suas costas mais claramente. Havia uma corcova grotesca, como a de um corcunda. Eu sorri para mostrar à garota que estava tudo bem, eu estava lá para ajudar, para conversar. Sentei ao lado dela e comecei o bate-papo com um simples "olá".
A garotinha mostrou-se chocada e arriscou um "oi" depois de me encarar longamente nos olhos.
Eu sorri e ela timidamente sorriu de volta. Nós conversamos até a noite declinar e o parque ficar completamente vazio.
Todos tinham ido e estávamos sós. Perguntei à garota porque ela estava tão triste.
A garotinha olhou para mim e, com uma carinha triste, disse:
- "Porque eu sou diferente."
Eu imediatamente respondi:
- "É !" e sorri.
A garotinha ficou ainda mais triste e disse,
- "Eu sei."
- "Garotinha", eu disse, - "Você me lembra um anjo, doce e inocente."
Ela olhou para mim e sorriu. Vagarosamente ela ficou em pé e disse,
- "Verdade?".
- "Sim, - você é como um pequeno anjo da guarda mandado para olhar por todas as pessoas que passam." Ela balançou sua cabeça afirmativamente, sorriu e, com isso, alargou suas asas e disse,
- "Eu sou. Eu sou o seu anjo da guarda", com um leve piscar em seus olhos.
Eu fiquei sem fala, certo de que estava vendo coisas. Ela disse,
- "Pelo menos uma vez você pensou em alguém que não fosse você mesmo. - "Meu trabalho está feito aqui." Imediatamente me levantei e disse,
- "Espere, então porque ninguém parou para ajudar um anjo?".
Ela olhou para mim e sorriu, "Você era o único que podia me ver e você acredita nisso em seu coração."
E ela se foi. A partir daí, minha vida mudou drasticamente.
Portanto, todas as vezes que pensar que você é tudo o que você tem, lembre-se: seu anjo está sempre olhando por você...

Autor Desconhecido

A Menina dos Brincos de Ouro


Uma Mãe, que era muito má para os filhos, deu de presente a sua filhinha um par de brincos de ouro.

Quando a menina ia à fonte buscar água e tomar banho, costumava tirar os brincos e botá-los em cima de uma pedra.

Um dia ela foi à fonte, tomou banho, encheu o pote e voltou para casa, esquecendo-se dos brincos.

Chegando em casa, deu por falta deles e com medo da mãe brigar com ela e castigá-la correu à fonte para buscar os brincos.

Chegando lá, encontrou um velho muito feio que a agarrou, botou-a nas costas e levou consigo.

O velho pegou a menina, meteu ela dentro de um surrão, coseu o surrão e disse à menina que ia sair com ela de porta em porta para ganhar a vida e que, quando ele ordenasse, ela cantasse dentro do surrão senão ele bateria com o bordão.
Em todo lugar que chegava, botava o surrão no chão e dizia:
Canta, canta meu surrão,
Senão te meto este bordão.

E o surrão cantava:
Neste surrão me meteram,
Neste surrão hei de morrer,
Por causa de uns brincos de ouro
Que na fonte eu deixei.
Todo mundo ficava admirado e dava dinheiro ao velho.

Quando foi um dia, ele chegou à casa da mãe da menina que reconheceu logo a voz da filha. Então convidaram Ele para comer e beber e, como já era tarde, insistiram muito com ele para dormir.

De noite, já bêbado, ele ferrou num sono muito pesado.
As moças foram, abriram o surrão e tiraram a menina que já estava muito fraca, quase para morrer. Em lugar da menina, encheram o surrão de excrementos.
No dia seguinte, o velho acordou, pegou no surrão, botou às costas e foi-se embora. Adiante em uma casa, perguntou se queriam ouvir um surrão cantar. Botou o surrão no chão e disse:
Canta,canta meu surrão,
Senão te meto este bordão.

Nada. O surrão calado. Repetiu ainda. Nada.
Então o velho meteu o cecete no surrão que se arrebentou todo e lhe mostrou a peça que as moças tinham pregado.

A velha gulosa

Um garoto estava trepado no mutá, entre os galhos de uma árvore, pescando, quando passou por ali a velha gulosa, que ao vê-lo, pediu-lhe que descesse. O garoto recusou e a velha mandou um bolo de maribondos atacá-lo.
O rapaz matou os maribondos e ela mandou um bolo de tocandiras. As ferroadas das terríveis formigas fizeram com que o rapaz se atirasse à água e então a velha pegou-o com uma rede e levou-o para casa. Aí preparou fogo sob o moquém para moquear a sua caça.
A filha da velha, porém, viu o moço e libertou-o, fugindo com ele, senão a mãe matava-a. Os dois fugiram pelo mato e a velha foi atrás deles. Mas eles fizeram numerosos balaios, transformaram-nos em animais: antas, capivaras, veados, porcos, pacas, cutias. A velha ia comendo tudo e eles iam ganhando tempo. Depois a moça não pôde mais acompanhá-lo e ele seguiu sozinho.
Ia passando por uma árvore cheia de macacos quando ouviu o grito da velha "can-can-can-can!". Pediu aos macacos que o escondessem, eles o esconderam no pote de mel.
A velha passou sem vê-lo e ele seguiu.
Ia passando perto da casa da surucucu quando ouviu de novo o grito da velha. Pediu asilo à cobra, que o escondeu ao fundo da toca. Mas ouviu que a cobra macho mandava a mulher preparar o moquém para o comerem e pediu socorro ao maracanã que comeu duas surucucu. O moço então saiu, andando pelo campo e quando chegou à margem dos lagos, ouviu de novo o grito da velha que vinha vindo. Pediu ao tuiuiu que o levasse para longe. O tuiuiu fê-lo subir às suas costas e bateu as grandes asas, levando-o até pousar no alto de uma árvore, dizendo ao moço que não podia prosseguir, estava cansado. O moço viu do alto da árvore uma choupana e foi lá. Morava nela uma velhinha bondosa que lhe deu de comer. O moço contou-lhe a história toda: quando era garotinho fora apanhado pela velha gulosa. Desde então vinha fugindo e agora era um homem feito.
A velha bondosa olhou-o bem, reconheceu nele seu filhinho desaparecido havia muitos anos. Ficou muito alegre. Os dois se abraçaram e cantaram de satisfação. E desde então o moço ficou na casa com sua mãe e a velha gulosa nunca apareceu por ali.

("A velha gulosa". Diário do Paraná. Curitiba, 15 de maio de 1960)

O Velho Ambicioso

Um Velho tinha um filho muito trabalhador. Não podendo ganhar a vida como desejava em sua terra, despediu-se do pai e seguiu viagem para longe a fim de trabalhar.
A princípio mandava notícias e dinheiro mas depois deixou de escrever e o velho o julgava morto.
Anos depois, numa tarde, chegou à casa do velho um homem e pediu abrigo por uma noite. Durante a ceia conversou pouco e deitou-se logo para dormir. O velho notando que o desconhecido trazia muito dinheiro, resolveu matá-lo.
Relutou muito mas acabou cedendo à ambição e tentação e assassinou o hóspede, enterrando-o no quintal do sítio. Voltou para a sala e abriu a mala do morto.
Encontrou ali as provas de que se tratava do próprio filho, agora rico, e que vinha fazer-lhe uma surpresa.
Cheio de horror, o pai matador foi entregar-se à justiça e morreu na prisão, carregado de remorsos.

Para quê....


Era uma vez um homem muito rico que resolveu viajar e então pegou seu iate e saiu pelo mundo. Certo dia, chegou a uma ilha maravilhosa, cheia de riachos, de água cristalina e cachoeiras. Tinha também muitos tipos de árvores frutíferas e muito peixe. O homem rico começou a andar pela ilha e encontrou um caboclo deitado numa rede, olhando para aquele mar muito azul. Chegou bem perto do caboclo e puxou conversa:
- Muito bonito tudo por aqui...
- É...disse o caboclo, sem tirar os olhos daquele mar.
- Tem muito peixe nesse mar?
- É só jogar a rede e pega quantos quiser.
- Por que você não pesca bastante?
- Para quê?
- Ora, você pega um montão de peixes e vende.
- Para quê?
- Com o dinheiro destes peixes, você compra uma canoa maior, vai mais no fundo e pega mais peixe ainda.
- Para quê?
- Com o dinheiro você compra mais um barco, pega mais peixe e ganha mais dinheiro.
- Para quê?
- Você vai juntando, cada vez mais dinheiro, compra cada vez mais barcos, até chegar uma dia em que você terá uma indústria de pesca.
- Para quê?
- Ora, meu homem, você então será um homem poderoso, um homem rico, terá tudo que quiser, tudo o que sonhar, poderá comprar um iate como o meu, poderá comprar uma ilha como esta e então ficar o resto da vida descansando, sem preocupações...
- E o que é que eu estou fazendo agora?

Autor Desconhecido

A Águia e a Galinha


"Era uma vez um camponês que foi à floresta vizinha apanhar um pássaro, a fim de mantê-lo cativo em casa. Conseguiu pegar um filhote de águia.
Colocou-o no galinheiro junto às galinhas. Cresceu como uma galinha.
Depois de cinco anos, esse homem recebeu em sua casa a visita de um naturalista. Enquanto passeavam pelo jardim, disse o naturalista:
- Esse pássaro aí não é uma galinha. É uma águia.
- De fato, disse o homem.- É uma águia. Mas eu a criei como galinha. Ela não é mais águia. É uma galinha como as outras.
- Não, retrucou o naturalista.- Ela é e será sempre uma águia. Este coração a fará um dia voar às alturas.
- Não, insistiu o camponês. Ela virou galinha e jamais voará como águia.
Então decidiram fazer uma prova. O naturalista tomou a águia, ergueu-a bem alto e, desafiando-a, disse:
- Já que você de fato é uma águia, já que você pertence ao céu e não à terra, então abra suas asas e voe!
A águia ficou sentada sobre o braço estendido do naturalista. Olhava distraidamente ao redor. Viu as galinhas lá embaixo, ciscando grãos. E pulou para junto delas.
O camponês comentou:
- Eu lhe disse, ela virou uma simples galinha!
- Não, tornou a insistir o naturalista. - Ela é uma águia. E uma águia sempre será uma águia. Vamos experimentar novamente amanhã.
No dia seguinte, o naturalista subiu com a águia no teto da casa.
Sussurrou-lhe:
- Águia, já que você é uma águia, abra suas asas e voe!
Mas, quando a águia viu lá embaixo as galinhas ciscando o chão, pulou e foi parar junto delas.
O camponês sorriu e voltou a carga:
- Eu havia lhe dito, ela virou galinha!
- Não, respondeu firmemente o naturalista. - Ela é águia e possui sempre um coração de águia. Vamos experimentar ainda uma última vez. Amanhã a farei voar.
No dia seguinte, o naturalista e o camponês levantaram bem cedo. Pegaram a águia, levaram-na para o alto de uma montanha. O sol estava nascendo e dourava os picos das montanhas.
O naturalista ergueu a águia para o alto e ordenou-lhe:
- Águia, já que você é uma águia, já que você pertence ao céu e não à terra, abra suas asas e voe!
A águia olhou ao redor. Tremia, como se experimentasse nova vida. Mas não voou. Então, o naturalista segurou-a firmemente, bem na direção do sol, de sorte que seus olhos pudessem se encher de claridade e ganhar as dimensões do vasto horizonte.
Foi quando ela abriu suas potentes asas.
Ergueu-se, soberana, sobre si mesma. E começou a voar, a voar para o alto e voar cada vez mais para o alto.
Voou. E nunca mais retornou.

Autor Desconhecido

A BELA E A COBRA


Era uma vez um rei que tinha três filhas, uma das quais era muito formosa e ao mesmo tempo dotada de boas qualidades. Chamava-se Bela. O rei tinha sido muito rico, mas, por causa de um naufrágio, ficou completamente pobre.
Um dia foi fazer uma viagem; antes, porém perguntou às filhas o que queriam que ele lhes trouxesse. – Eu, disse a mais velha, quero um vestido e um chapéu de seda.
– Eu, disse a do meio, quero um guarda-sol de cetim.
– E tu que queres? – perguntou ele a mais nova.
– Uma rosa tão linda como eu, respondeu ela.
– Pois sim, disse ele.
E partiu.
Passado algum tempo trouxe as prendas de suas filhas, disse a mais nova:
– Pega lá esta linda rosa. Bem cara me ficou ela!
Bela ficou muito preocupada e perguntou ao pai por que é que lhe tinha dito aquilo. Ele, a princípio, não lho queria dizer, mas ela tantas instâncias fez, que ele lhe respondeu que no jardim onde tinha colhido aquela rosa encontrou uma cobra, que lhe perguntou para quem ela era; que ele lhe respondeu que era para a sua filha mais nova e ela lhe disse que lha havia de levar, se não que era morto. Depois disse ela:
– Meu pai, não tenha pena, que eu vou.
Assim foi. logo que ela entrou naquele palácio, ficou admirada de ver tudo tão asseado, mas ia com muito medo. O pai esteve lá um pouco de tempo e depois foi-se embora. Bela, quando ficou só, foi a uma sala e viu a cobra. Ia-se a deitar quando começaram a ajudarem-na a despir. Estava ela na cama quando sentiu uma coisa fria; deu um grito e disse-lhe uma voz: – Não tenhas medo.
Em seguida foi ver o que era e apareceu-lhe uma cobra. Ela, a princípio, assustou-se, mas depois começou a afagá-la. Ao outro dia de manhã apareceu-lhe a mesa posta com o almoço. Ao jantar viu pôr a mesa, mas não viu ninguém; a noite foi-se deitar e encontrou a mesma cobra. Assim viveu durante muito tempo, até que um dia foi visitar o pai; mas quando ia a sair ouviu uma voz que lhe disse:
– Não te demores acima de três dias, senão morrerás.
Ia a continuar o seu caminho e já se esquecia do que a voz lhe tinha dito. Chegou a casa do pai. Iam a passar três dias quando se lembrou que tinha de tornar; despediu-se de toda a sua família e partiu a galope; chegou lá à noite, foi-se deitar, como tinha de costume, mas já não sentiu o tal bichinho. Cheia de tristeza, levantou-se pela manhã muito cedo, foi procurá-lo no jardim e qual não foi a sua admiração vendo-o no fundo dum poço! Ela começou a afagá-lo chorando; mas, quando chorava, caiu-lhe uma lágrima no peito da cobra; assim que a lágrima lhe caiu a cobra transformou-se num príncipe, que ao mesmo tempo lhe disse:
– Só tu, minha donzela, me podias salvar! Estou aqui há uns poucos de anos e, se tu não chorasses sobre o meu peito, ainda aqui estaria cem anos mais.
O príncipe gostou tanto dela que casou com ela e lá viveram durante muitos anos.

José Leite de Vasconcelos

A Roupa do Rei

Era uma vez um tão vaidoso de sua pessoa que só faltava pisar por cima do povo. Certa vez procuram-no uns homens que eram tecelões maravilhosos e que fariam uma roupa encantada, a mais bonita e rara do mundo, mas que só podia ser enxergada por quem fosse filho legítimo.
O rei achou muita graça na proposta e encomendou o traje, dando muito dinheiro para sua feitura. Os homens trabalharam dia e noite num tear mágico, cozendo com linha invisível, um pano que ninguém via.
O rei mandava sempre ministros visitarem a oficina e eles voltavam deslumbrados, elogiando a roupa e a perícia dos alfaiates. Finalmente, depois de muito dinheiro gasto, o rei recebeu a tal roupa e marcou uma festa pública para ter o gosto de mostrá-la ao povo.
Os alfaiates compareceram ao palácio, vestindo o rei de ceroulas, e cobriram-no com as peças do tal traje encantado, ricamente bordado mas invisível aos filhos bastardos.
O povo esperou lá fora pela presença do rei e quando este apareceu todos aplaudiram com muito entusiasmo. Os alfaiates, aproveitando a festa, desapareceram no meio do mundo.
O rei seguiu com o cortejo, mas, atravessando uma das ruas pobres da cidade, um menino gritou:
- O Rei está de ceroulas!
Todo mundo ali presente reparou e viu que realmente o rei estava apenas de ceroulas. Uma grande e entrondosa vaia foi o que se ouviu. O rei correu para o palácio morto de vergonha. Desse dia em diante corrigiu-se seu orgulho. E enquanto durou seu reino foi um rei justo e simples para o seu povo.

Hans Chistem Andersen